segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Rastafari

Nós não podemos realmente nos entender, a não ser que conheçamos as nossas próprias raízes espirituais.

Qual o conteúdo espiritual que é evocado pelo nosso inconsciente, é questão de destino individual, tendo tudo a ver com a época, o tempo em que vivemos.

Os arquétipos deste conteúdo residem neste tempo e espaço.

Por este motivo, o rastafarianismo é tão presente nos dias atuais. Ele tem relação com as experiências mais recentes do inconsciente coletivo, de um povo que encontrou, na vivência espiritual ancestral, a tábua de salvação para as provações impingidas por seus algozes.

Neste contexto, para dar sentido ao tremendo sofrimento da experiência da escravidão, do exílio, das punições inumeráveis, o rastafari se apega à única fonte de esperança possível de explicação, o espírito, a alma humana; fazendo da numinosidade de Jah a morada da resignação e luta.
Apesar da consolidação de Haile Selassie I como ícone profético se estabelecer como base religiosa no ínicio do século passado, o sentimento divino da fé em Jeová vem desde a colonização da Jamaica e a consequente escravização dos irmãos africanos enviados para o trabalho nas Antilhas.

Este sentimento é fundado no Velho Testamento onde a figura monoteísta de Jah se encontra no coração do ser humano, diferente da compreensão cristã que coloca Deus nas alturas, no céu.

Nesta singular concepção numinosa é criada a figura do “Eu e Eu”, que nada mais é que a unidade do “Espirito Santo”.

Assim o Rastafari vê e compreende a consciência humana, de forma interior, de dentro para fora, compreendendo o mundo exterior como formado por matrizes de diversas verdades.

É nesta coagulação de várias verdades que o “Eu e Eu” busca sempre a divina “Real Verdade”.

Jung define bem este sentimento ao afirmar que “a vida é multifacetada e, entre as muitas verdades possíveis relativas à vida humana, depende daquilo que é a verdade naquele momento para aquela determinada pessoa.

O Eu e Eu, o Espírito Santo é o sentimento mais forte presente no rastafarianismo. O rastafari tem a necessidade de contato constante com esta divina relação com seu inconsciente. Por isso que, diferente de outras religiões onde a pessoa dedica parte do seu tempo para as atividades religiosas, o rastaman é rastafari em tempo integral. É o que chamamos de “bushman” ou “homem santo”.

Para se chegar neste caminho, onde o consciente se encontra com o subconsciente é que a Erva Sagrada, a Ganja, ou como é negativamente chamada no Brasil de “maconha” é usada.

Neste processo, a ganja é um canalizador. É através dela que se chega ao estado numinoso, onde o homem encontra e percebe o Espirito Santo.
Este é um dos mais antigos exercícios de espiritualidade que o ser humano já experimentou. Tão ou mais antigo que a nossa própria percepção do consciente/subconsciente.

Existem incontáveis relatos do uso da erva como canalizador espiritual na antiguidade. A Bíblia é recheada de passagens citando a cannabis em rituais, de Genesis ao Apocalipse.

Antes da formatação do Velho Testamento já encontramos referências religiosas à maconha. Em documentos Babilônicos e Ititas, que retratam a epopéia de Gilgamesh, escritos a cerca de 6.000 anos, encontramos referências da cannabis como a “Erva da Vida” e “Erva do Rejuvenescimento da Vida” (fonte: livro O significado arquetípico de Gilgamesh, por Rivkah Scharf Kluger, pag.194).

Heródoto, estudioso que viveu no século XI, escreveu o que podemos compreender como o maior compêndio da História da Religião na antiguidade. Relata o uso da maconha presente em quase todos os cultos religiosos dos primórdios da humanidade.

Podemos afirmar com tranquilidade que o relacionamento do ser humano com a erva é anterior à nossa saída do paraíso. Fato relatado por Moisés, Velho Testamento, como a “Árvore da Vida” (Gênesis 2,9).

Nesta linha de raciocinio podemos vislumbrar que também no Novo Testamento encontramos as referências da planta sagrada.

E, entre todas as citações, de vários apóstolos de Cristo, a mais significativa está na última página da Bíblia, em Revelações/Apocalipse 22:2 - “No meio das ruas da cidade, de cada lado do rio, lá estava a árvore da vida, que produz doze frutos diferentes, dando cada mês seus frutos; e as folhas da árvore são para a cura das nações.”
Podemos seguir o texto até o final, é só procurar que está lá, no “Livro da Vida”.

Nele “Eu e Eu” acredito, nele “Eu e Eu” me glorifico, na unidade do Espirito Santo.

Que a santa paz de Jah nos inunde!

RastafarI

(Texto escrito no presídio de Americana por Ras Geraldinho em 02.11.2012)

Um comentário:

  1. como eu queria te conhecer pessoalmente ras... seus textos estão me trazendo profunda clareza!

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