A
Cannabis acompanha a humanidade desde sua saída do paraíso.
Primeiro
cultivo dos grupamentos hominídeos, esta planta nos deu alimento,
roupas, proteção, cura, artefatos de engenharia e êxtase.
Com
todos estes atributos, não é de se espantar que desde os primórdios
das civilizações ela tivesse relevante papel sacramental nas
religiões.
Na
pré-história, a planta já era tida como sagrada, garante Mircea
Eliade, especialista em história das religiões, sendo ela usada
ritualisticamente pela maioria das crenças da antiguidade.
As
religiões da India, China, África e Oriente Médio sempre usaram a
Cannabis como canalização para a experiência numinosa.
Antes
da proibição da planta no Brasil, em 1937, a defumação dos
terreiros de umbanda era feita com a Erva e no cachimbo do Preto
Velho não tinha fumo, o que se pitava era a Diamba.
Não
diferente são os costumes Judaico-Cristãos. Tanto o Pentateuco
quanto outros livros sagrados judeus, como a Biblia Cristã, são
repletos de citações da planta.
Começando
em Gênesis e como última citação em Revelações (apocalipse)
22-2 lá está a Árvore da Vida.
Moisés
foi um dos maiores difusores do seu uso ritualistico, estando ela
presente nos cinco livros.
O
interessante é que a planta sagrada é usada de duas maneiras: como
incenso e como óleo de unção.
Exodus
40 é abundante no uso dos dois elementos, o óleo e o incenso, onde
tudo e todos são ungidos pelo óleo, e a fumaça é constante no
Tabernáculo. Seria até enfadonho fazermos a citação de todas as
passagens, pois são inúmeras as referências.
Porém,
em relação ao incenso, fumaça, existe a passagem de Pentecostes
que é exemplar, que em resumo diz: “setenta profetas no
Tabernáculo, cada um com turíbulo (incensário) em sua mão e uma
língua de fogo se acendeu na cabeça de cada um.
Quanto
ao uso dos santos óleos encontramos sábia referência nos textos de
um monge que viveu no século quinto, que por razões de anonimato
usava a alcunha de Pseudo-Dionisio. Este clérigo, identificado como
filósofo-teológo é reconhecido como o construtor da iniciação da
mística cristã.
Em
sua obra intitulada “O Areopagita” ele descreve a real
importância do óleo na liturgia, que transcrevemos:
Capítulo
4: -
“I-
Sobre aquilo que se realiza graças aos santos óleos e as
consagrações às quais eles servem.”
“Tal
é, pois, a grandeza da Santíssima Comunhão, e tais são os belos
espetáculos pelos quais temos lembrado muitas vezes. Ela eleva nossa
inteligência até o Uno, graças a estes ritos hierárquicos que nos
fazem entrar em comunidade e em comunhão com ele. Mas existe outra
consagração que pertence à mesma ordem: nossos mestres a chamam de
sacramento da unção. Quando examinamos de maneira sistemática as
santas imagens que no-lo representam, a multiplicidade destes
símbolos nos elevará por meio da contemplação hierárquica até o
Uno.”
“II-
Mistério do Sacramento da Unção”
Como
para a comunhão, as ordens menos perfeitas são excluídas assim
que os membros da hierárquia tiverem espalhado santos perfumes
(incenso), em torno do templo, que se cantou piedosamente os salmos e
que se fez memória das Santíssimas Escrituras. O sumo-sacerdote
toma, então, o óleo santo, coloca-o sobre o altar dos divinos
sacrificios sob a proteção de doze asas santas.
Entretanto,
a assembléia inteira faz reboar o cântico de hino santíssimo que o
próprio Deus inspirou aos profetas.
Tendo
consagrado o óleo por uma santíssima invocação, ele o utiliza
para as mais santas consagrações litúrgicas, por ocasião de quase
todas as cerimônias hierárquicas.”
III-
“Contemplação”
“ O
ensinamento espiritual ao qual nos eleva este rito consecratório da
santa benção do óleo, é, creio, o de nos mostrar que os homens
piedosos guardam secreto o bom odor de sua santidade intelectual.
Porque o próprio Deus prescreve aos santos não pôr à vista por
vão esforço de glória a beleza e o bom odor do esforço virtuoso
pelo qual eles tendem à semelhança do Deus oculto. Essas secretas
belezas divinas, cujo perfume ultrapassa toda operação da
inteligência, escapam, realmente, a toda profanação; elas não se
revelam senão à inteligência daqueles que tem o poder de
compreende-las, porque lhes convém não se refletir em nossas almas
a não ser através das imagens que se lhes assemelham e que tenham,
como elas, a virtude da incorruptibilidade.”
“Ora,
a representação desta virtuosa conformidade com Deus não desenha,
de fato, a imagem autêntica de seu modelo a não ser quando a alma
fixa seu olhar nessa Beleza inteligível e perfumada; porque somente
a este preço ela pode imprimir e reproduzir em si mesma as mais
belas imagens.”
“A
contemplação atenta e constante dessa Beleza perfumada e secreta é
que permite atingir a exata semelhança do modelo, a perfeita
conformidade divina.
… contudo,
se praticam as virtudes que a imitação de Deus exige, não é de
modo nenhum para se dar em espetáculo aos homens, segundo as
palavras das Escrituras (MT 23-5) e, sim, graças ao símbolo do óleo
divino, para se iniciar santamente nos mistérios infinitamente
sagrados que a Igreja dissimula.
“Que
dizer ainda? Não é verdade que consagrando os óleos procede-se
conforme os mesmos ritos que para a comunhão? Nós já o
recordamos.”
“Assim
a composição simbólica dos santos óleos, dando de algum modo
figura àquilo que é sem figura, mostra-nos de maneira figurada que
Jesus é a fonte fecunda dos divinos perfumes, que é ele próprio
que, na medida que convém à tearquia, difunde sobre as
inteligências que atingiram a maior conformidade com Deus e os
divinos eflúvios que seduzem agradavelmente as inteligências e que
as dispõem a receber os dons sagrados e a se saciar com um alimento
intelectual, cada potência intelectiva recebendo então as efusões
odoríferas, segundo a parte que toma nos mistérios divinos.”
Para
o monge-filósofo Pseudo-Dionisio, tanto o incenso quanto os santos
óleos são parte do sacramento religioso. Poderíamos dizer que são
canalizadores para com o numinoso (o divino). Suas exegeses (textos),
baseados no platonismo, influenciaram toda teologia posterior, são
marcadas pela crença de que o ser humano aproxima-se de Deus através
do abandono da percepção e da razão, a chamada via apotática.
(Bibliografia:
“Obra Completa – Pseudo-Dionisio o Areopagita – Editora Paulus
– 2004)
Que
a glória de Jah se derrame sobre nós!
Ras
Geraldinho
Rastafari
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