domingo, 28 de fevereiro de 2016

Iperó, 10 de fevereiro de 2016

Três anos e meio de injusta enxovia.

Mais uma prova de suplício patrocinado pela Justiça Paulista.

Recebi a informação de que estaria em trânsito para o CDP de Americana às 15:30 horas.

Estava tranquilamente trançando uma sacola, quando recebi o informativo do "trânsito".

O choque da notícia aflorou todo o sofrimento que já havia experimentado duas vezes antes. Eu já sei cada movimento que me levará até a presença do nobre Juiz do fórum de Americana até a volta para o Raio I da Penitenciária de Iperó. E estas lembranças são de arrepiar!

Terei dezessete dias de tortura pela frente...

Sei que quando me apresentar ao nobre senhor juiz estarei alquebrado e, no final desta macabra epopeia, estarei mais que moído, física e psicologicamente.

19:00 horas - Neste momento, encontro-me na cela 02 do trânsito carcerário com mais dezoito detentos, espíritos que não tem a mínima noção de qual surpresa a Secretaria Penitenciária do Estado de São Paulo - o braço vingativo da sociedade - lhes reserva.

São pessoas que não sabem para qual estabelecimento penal estão sendo transferidos. 
São vinte agora, pois o agente acaba de entulhar mais dois apenados. 

Vinte almas dividindo um espaço porcamente desenhado para seis.

É abjeto e deplorável.

O primeiro dia do período da quaresma registra o dia mais quente do ano. E estamos todos deitados, espremidos, exatamente como sardinhas em lata, em uma cela sem a mínima ventilação.

A única coisa que pode nos confortar é a fé na "Santa Kaya", que acaba de chegar - Jah Rastafari!

Vinte e seis de fevereiro de 2016

11:00 horas - O infortúnio dos dias passados e não escritos por mim, ficarão como reminiscências do desgraçado apenado.

O fato da "carga viva" transportada pela Secretaria de Segurança do Estado (tucano) de São Paulo ser tratada pior do que os porcos capotados numa rodovia paulista recentemente é mero detalhe, mas uma coisa me bateu n'alma, no retorno ao Raio I de Iperó: como num flash de memória, vi-me teleportado para uma cena de filme.

Abre a cena: película em tom pastel, paredes brancas encardidas pelo tempo, portas azuis pálidas, típicas dos filmes da década de 1960 (prisão do século passado).
Pelo pátio perambulam os detentos, procurando os primeiros raios de sol da manhã, vitimados de uma preguiça advinda de 18 horas de confinamento.

O protagonista, preso usando o uniforme padrão, sustenta-se nos últimos fiapos de lucidez que lhe restam, devido a extenuante seção de tortura de mais de uma semana. Submisso à desgraçada situação, cambaleante, entre a vertigem e a realidade, ele se abaixa sobre um balde de água (suja) e sabão, lavando uma manta surrada e desforme.

"Close" no rosto, que retrata o sofrimento e cansaço do detento, enquanto ele bate aquele trapo contra a água, em movimento autômato.

Ao fundo, começamos a perceber o som de um violino (do membro da igreja do presídio), que chora acordes melodiosos.

Então a imagem que mostra os derradeiros instantes de lucidez daquele indivíduo antes do desmaio.

Fim da cena.

Ras Geraldinho - preso político, ano 2016


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Iperó, 02 de Janeiro de 2016

Três anos e cinco meses de prisão política.

Exma. Sra. Dilma Rousseff, Presidenta do Brasil

Ilustríssimos senhores e senhoras da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

Eu, Geraldo Antonio Baptista (Ras Geraldinho),  elder da Primeira Igreja Niubingui Etíope Coptic de Sião do Brasil, entidade plenamente regulamentada, de cunho religioso e filosofia rastafári, venho, neste vergonhoso momento para a nossa democracia, gritar por ajuda, socorro, por manifestação de defesa aos direitos humanos universais da minha pessoa (condenada /penitenciada) além dos demais membros da nossa Niubingui, que sofrem processo judicial, perseguição policial e política, além de constrangimento moral e psicológico.

Sou líder religioso Rastafári, de fé numinosa “etíope copta de sião”.

Hoje me encontro preso na Penitenciária Odon Ramos Maranhão, na cidade de Iperó-SP, acusado falsamente por tráfico de drogas e associação para o crime, condenado desde agosto de 2012, em regime de exceção de direito, por “crime ideológico”.

Sou tecnicamente reconhecido como preso político, como poderá atestar o Dr. Alexandre Khuri Miguel, OAB/SP 118.352.

Aguardo Habeas Corpus do STF, protocolado em dezembro de 2014, onde a subprocuradora geral da república, Dra. Débora Duprat, concedeu provimento ao recurso, registrado eletronicamente em 15/01/2015. Ou seja, estou aguardando há 01 ano pela assinatura do ministro do STF. Isso é cruel!

Nunca cometi atos ilícitos em minha vida. Toda a história da Primeira Igreja Niubingui Etíope Coptic de Sião do Brasil pode ser encontrada na internet, nos sites, blogs e redes sociais (palavras-chave: niubingui, Ras Geraldinho, Geraldo Coptic).

Somos, hoje, minoria reprimida, injustiçada e violentada pela Justiça que, por obrigação constitucional, deveria nos proteger.

Este ódio institucional é fruto de Justiça caolha, que não aceita o fato da cannabis ser sacramento em nosso aprisco.

Passamos pelos mesmos sofrimentos que os irmãos do Santo Daime passaram há anos atrás, quando o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito ao uso ritualístico da erva sacramental Ayahuasca.
As ervas de poder sempre foram reconhecidas como direito religioso pétreo, inclusive garantido em artigo específico na Constituição da República Federativa do Brasil.

Nunca estivemos na clandestinidade, nem praticamos atos ilícitos; nunca traficamos, nem vendemos ou distribuímos cannabis. As plantas sagradas que plantávamos no jardim privado da nossa igreja eram unicamente para representação numinosa (Mateus 12-1~8 / Marcos 2-23~25 / Lucas 6-1-3) ou como incenso sacramental (inalante espiritual).

Não se trata de uma invenção: estamos falando de cultura religiosa milenar, que até hoje é perseguida.

Estamos falando de assunto ideológico e não criminal. O que nos traz às vossas honradas presenças é o pedido de imediato socorro contra ação de patrulhamento ideológico, portanto, perseguição política.

Estou Condenado pelo ódio, mentira, inveja, avareza política, violência e, principalmente, pela mãe de todos estes abjetos espíritos, que é a ignorância.

Estou Preso por crime ideológico, pela hipista ignorância filosófica, a esfinge do inconsciente coletivo, como costumo dizer. Enquanto a ignorância funcional impacta unicamente o individuo ignorante, a hedionda ignorância filosófica solapa os direitos humanos de toda a comunidade que se encontra à sombra do rampante poder, condenando muitos ao sofrimento.

Sou Testemunha física do atual estado de atraso da Justiça brasileira, com especial referência à Justiça Paulista.

Sou Vítima do perverso e supra-corrupto Sistema Prisional Paulista.

Estou Desamparado pelo “Espírito Grego da Democracia”.

Fui Travestido pelo Ministério Público, para aceno de cartola ao poder cinza dos obreiros do Universo.

Fui Sentenciado por argumentação semântica e ódio preconcebido de consciência jurídica bipolar, formatada no castigo.

Fui Julgado por questão moral e filosófica.

Sendo assim que sinto, declaro-me PRESO POLÍTICO e solicito o amparo deste Ministério.


Agradeço a inestimável atenção e assino,


Geraldo Antonio Baptista (Ras Geraldinho)

Matricula no Sistema Prisional Paulista nº 768.403